Moda nos Museus: a partir de quando e por que a temática se destaca nos museus?
Você tem curiosidade de saber a partir de quando e por que os museus passaram a se interessar por moda? Eu também tive e investiguei...
Este texto não é inédito, pois faz parte da
contextualização da minha tese de doutorado que você pode ler na íntegra no
link que deixarei ao final. Como
poucos se aventuram a ler uma tese, resolvi dar mais destaque para o tema aqui e também em vídeo - que postarei muito em breve em meu canal do you tube. Ao final, deixarei também referências
bibliográficas para que você possa complementar seus conhecimentos.
Vamos ao
assunto...
Logicamente que roupas e têxteis estão
presentes em museus de diferentes tipologias desde muito tempo, mas até a
década de 60 o que se destacava eram as qualidades técnicas, estéticas e
processos de produção dos tecidos ou das roupas. Somavam-se a isso o valor
histórico do objeto. Mas eu explico melhor...
O surgimento da temática da moda nos museus
está diretamente ligado à presença de roupas e acessórios em seus acervos.
Porém é a partir da década de 1960 que o tema MODA passou a estar presente em
exposições e a ser o foco estratégico de museus europeus e norte-americanos
(Melchior, 2014).
Lembre-se que aqui o conceito de MODA é ABRANGENTE e avança no sentido de sua compreensão como SISTEMA. Deste ponto de vista a
moda se desdobra em componentes imateriais – maneira,
estilo, conjunto de opiniões, tendências – que se manifestam por objetos materiais, que
são as roupas e acessórios.
Voltando ao tema...
O ponto alto na transição e no interesse pela
inserção da moda nos museus ocorreu com a exposição intitulada Fashion, Anthology by Cecil Beaton, no
Victória & Albert Museum, de Londres, em 1971 (Melchior, 2014).
Em 1973, a exposição intitulada The World of Balenciaga marcou o início
da reformulação das exposições do Metropolitan Museum - Costume Institute, de
Nova York, transformando-a em uma experiência imersiva, reflexo da inserção de
iluminação e objetos, tais como manequins, artefatos e mobiliário, como pano de
fundo (Koda; Glasscock, 2014). Neste último caso, foi a influência da
editora-chefe de moda Diana Vreeland que apontou os novos rumos das exposições,
o que repercute na forma de expor do museu até os dias de hoje.
Diana Vreeland foi editora-chefe de duas das
maiores revistas de moda de alcance internacional: Vogue e Harper´s Bazaar,
e consultora do museu de 1972 até sua morte, em 1989. De acordo com o MET, a
influência de Diana repercutiu também nos museus europeus.
Diana Vreeland Curating the World of Balenciaga, Photo by Harry Benson, NYC, 1973.
Vou ilustrar a adaptação e a renovação de
acervos de alguns museus relevantes no cenário europeu com a inserção da
temática da moda.
Primeiro, o Designmuseum, da Dinamarca, fundado em 1890, é um exemplo de museu que
alterou o nome de sua coleção no decorrer do tempo, a partir da percepção de
que o interesse por exposições de moda aumentava. O acervo de têxteis
intitulava-se The Textile Collection
e, a partir de 2007, passou a chamar-se The
Textile and Dress Collection (Toftegaard, 2014). Veriquei acessando o site do museu e constatei que a coleção atualmente
se chama Fashion and Textile Design.
O Mode Museum, da Antuérpia (Bélgica), focado
em moda, inclui criações de designers de moda contemporâneos e, também, tem
suas raízes em coleções de vestuário. O museu foi criado em 2002 a partir do
antigo Costume and Textile Museum Vrieselhof, cuja história
remonta ao acervo de roupas e tecidos pertencentes a habitantes dos Flandres,
iniciado em 1930 por um grupo de historiadores e
colecionadores.
Europeana Fashion - MoMu Fashion Museum in Antwerp
Em 1937, foi criado o Museum of Costume Art em
Nova York, que em 1946 passou a chamar-se Costume Institute e se vinculou ao
Metropolitan Museum of Art – MET. Desde
1959, o Costume Institute é um
departamento de curadoria do MET e promove exposições temáticas e específicas
de importantes designers de moda, como as que ocorreram sobre Poiret, em 2007,
Alexander McQueen, em 2011, e Rei Kawacubo em 2017.
Costume_MET_Dt10209
O atual Fashion Museum de Bath, na Inglaterra, foi
fundado em 1963, mas até 2007 chamava-se Museum of Costume. Abrange em seu acervo
objetos criados a partir do século XVIII: vestuário, acessórios (chapéus,
bolsas, sapatos) masculinos e femininos, fotografias, desenhos, revistas e
documentos. A estratégia do museu é apresentar seu acervo e envolver pessoas de
diferentes nacionalidades, idades, gêneros e bases culturais para que se
inspirem, aprendam e se divirtam.
Site do Fashion Museum Bath
Os
museus mencionados têm em comum a inclusão da temática de moda em seus
contextos, seja pela inserção da palavra moda
(fashion) no nome do museu, seja pela
reunião de objetos dessa tipologia em seu acervo.
Fonte: Collection of V&A Museum - Jeans Levi Strauss 501
Os museus se deram conta que a temática era e é
muito atrativa, passando a ser estratégico para os museus. Nesse sentido, cabe
a pergunta: por que os museus passaram a ter interesse em moda? A resposta pode
ser dada a partir das considerações de autores como Melchior (2014) e Teunissen
(2014), que apontam a popularidade da temática, a produção de exposições
espetaculares, o interesse e a visibilidade dada pelas mídias e, como
consequência, o aumento do número de visitantes.
Há um encadeamento das movimentações mencionadas,
pois a popularidade da moda nos museus é viabilizada por investimentos
econômicos para produzir as grandes exposições (principalmente nos museus de
grande porte) e, também, contribuir com discussões sobre o tema que contemplam
o fenômeno da moda e o estudo dos objetos e da história.
De acordo com Teunissem (2014), os museus
também se transformaram em um “novo” lugar para compreender o trabalho de
vanguarda de designers de moda e entender a moda como parte da cultura visual
contemporânea. A temática tem forte apelo entre o público jovem, que muitas
vezes reluta em visitar uma exposição de roupas folclóricas, por exemplo. Neste
último ponto, há a necessidade de os museus dessa tipologia pensarem em
estratégias de aproximação entre o acervo e o público.
Importante ressaltar que, no que diz respeito aos acervos, objetos de moda e têxteis TAMBÉM estão
inseridos em museus de diferentes temáticas, por exemplo em museus de arte
(no Brasil, temos como exemplo o MASP com um importante acervo), também em museus
históricos, de design (Designmuseum,
da Dinamarca; MUDE de Lisboa), de ciência e tecnologia (Norwegian Museum of Science and Technology) e artes aplicadas (Musée des Arts Décoratifs).
Espero ter contribuído um pouco sobre o tema e se você
quiser usar parte deste artigo, busque a fonte (minha tese no link abaixo ou nas referências) e
não esqueça de mencioná-las. Esta foi uma pesquisa que demandou muito tempo e
dedicação. Obrigada e compartilhe para pessoas interessadas na área para que
possamos trocar informações.
Link da tese: Museu Moda e Têxtil UFRGS - Tese de doutorado
Referências:
KODA,
Harold; GLASSCOCK, Jessica. The Costume Institute at the Metropolitan Museum of
Art: an evolving history. In: MELCHIOR, Marie Riegels; SVENSSON, Birgitta
(Ed.). Fashion and Museum: theory and practice. London: Bloomsbury
Publishing, 2014. p. 21-32.
MELCHIOR,
Marie Riegels. Introduction: understanding fashion and dress museology. In:
MELCHIOR, Marie Riegels; SVENSSON, Birgitta (Ed.). Fashion and Museum:
theory and practice. London: Bloomsbury Publishing, 2014. p.1-18.
TEUNISSEN,
José. Understanding Fashion through the museum. In: MELCHIOR, Marie Riegels;
SVENSSON, Birgitta (Ed.). Fashion and Museum: theory and practice.
London: Bloomsbury Publishing, 2014. p.33-45.
TOFTEGAARD,
Kirsten. Collecting practice: Designmuseum Danmark. In: MELCHIOR, Marie
Riegels; SVENSSON, Birgitta (Ed.). Fashion and Museum: theory and
practice. London: Bloomsbury Publishing, 2014. p. 139-151.
Sites:
Comentários
Postar um comentário