Tecido tricoline: do mais caro ao mais barato uma variação de 340%, por quê? Entenda...
O mercado, tanto varejista quanto atacadista, possui uma
infinidade de opções em diferentes estruturas de tecido de algodão, abrangendo tecidos de malha e os tecidos planos.
Após verificarmos, em um mesmo ponto de venda de comércio varejista, que o preço do tecido de nome comercial
TRICOLINE variava de R$ 12,80 até R$
56,00, resolvemos estudar melhor este caso. (Ao final do texto estão os créditos da pesquisa)
Na loja em questão, selecionamos 5 amostras de tricoline,
100%algodão, que diferenciavam-se apenas pela padronagem, mas com ampla
diferença nos preços, como se pode ver na imagem abaixo:
Chamaremos os tecidos de Amostra para facilitar a
identificação. Os valores nos chama muito atenção: Amostra 1 – R$ 56,00;
Amostra 2 – R$ 42,00; Amostra 3 – R$ 25,10; Amostra 4 – R$ 16,50 e Amostra 5 –
R$ 12,80. Ressalto que o tecido de menor valor não foi adquirido a preço
promocional e que os tecidos foram comprados no mesmo momento em uma loja no
centro da cidade de Porto Alegre-RS.
Apontaremos aqui algumas propriedades técnicas que talvez justifique uma diferença de 340% no preço do item mais
caro para o mais barato.
Focaremos nas questões técnicas do tecido porque a “marca” ou “fabricante” do produto não foi mencionada pelo
vendedor no momento da compra.
Se você preferir, assista o vídeo no em meu Canal no You Tube.
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Para buscar respostas, foi necessário nos “aproximarmos”, e
muito, dos tecidos submetendo-os para análise em microscópios potentes do
Laboratório de Seleção de Materiais da UFRGS.
Pontuamos que o tecido tricoline em questão é um tecido plano, cujas características são conferidas por sua construção: urdume e trama (o urdume são os fios dispostos no sentido do
comprimento do tecido e a trama os fio que cruzam perpendicularmente o urdume).
A estrutura do tecido apresenta ligamento em tela.
Agora, observem a imagem resultantes do microscópio. Na
primeira linha um aumento do tecido em 50x, e aqui se comprova o ligamento do
tecido em tela. Na segunda linha um aumento de 200x, onde começamos a analisar
os fios e seus arranjos. E, por último, imagens dos fios de cada tecido:
Além das imagens, analisamos também: densidade de fios no
urdume e trama, peso, estabilidade
dimensional e as fibras que compõe os fios. Isso
porque essas informações são igualmente relevantes para obtermos respostas aos
nossos questionamentos.
A tabela abaixo mostra os resultados que
alcançamos:
Daremos uma atenção especial ao fio, pois este pode ter um
impacto importante no preço do produto. Pela análise foi verificado que as
amostras 1, 2 e 3 foram produzidas com fios retorcidos no urdume e fios
singelos na trama. As amostras 4 e 5 foram produzidas com fios singelos tanto
no urdume quanto na trama.
Ressaltamos que as fibras são de grande importância em um
tecido. Suas características determinam aspectos dos fios e consequentemente,
conferem qualidade ao material. A fibra de algodão é compostas por
uma cutícula externa, uma parede primária, uma secundária e um canal central,
denominado “lúmen”. Outra característica da fibra de algodão é o que se observa
a partir da vista longitudinal, que se apresenta em formato de fita com torções
em intervalos regulares. na imagem abaixo pode ser observado aspectos longitudinais da fibra de uma das amostras.
Fibra de algodão com aumento de 400x
Na fibra de algodão, são observadas propriedades como:
comprimento, tipo, maturidade, resistência, finura, alongamento/elasticidade,
resiliencia, porosidade, fiabilidade e estabilidade dimensional. Sendo o
comprimento uma das propriedades considerada mais importante, pois determina
sua aplicação e seu valor. Dessa forma, é determinante na constituição do
tecido.
Normalmente, quanto mais finas as fibras, serão também mais longas, mais caras e normalmente, resultam em um tecido de melhor qualidade.
Os processos de acabamentos dos tecidos também devem
ser considerados, uma vez que, nesses processos, medidas industriais são
providenciadas para melhorar o aspecto e o toque do tecido. A partir das
amostras, não foi possível identificar todos os processos e produtos
utilizados, no entanto, pela análise observamos indícios de silicone, que pode conferir uma melhora significativa em seu acabamento.
Chegamos na seguinte conclusão: o consumidor que pretende
buscar no varejo um tecido de tricoline de algodão, diante de tamanha
diversidade de valor, só vai conseguir perceber diferenças se tiver conhecimentos
em têxteis. Mesmo tendo conhecimento, é praticamente impossível detectar algumas características no ponto de venda, pois existe a necessidade de uso de equipamentos potentes. A não ser que o vendedor seja uma pessoa
treinada para dar respostas e transmitir conhecimentos, com isso, certamente as
diferenças de preços seriam compreendidas.
Como foi apresentado, apesar de serem vendidos com mesmo nome
comercial, há grandes diferenças entre as amostras adquiridas no mercado. Parte
da diferença dos preços também se justifica pelos tipos de fios usados na
tecelagem: as amostras 1, 2 e 3 foram tecidas com fios retorcidos no urdume,
conferindo ao tecido maior durabilidade, resistência e caimento; enquanto as
amostras 3 e 4 foram produzidas com fios singelos, os quais estão diretamente
ligados a fios de menor valor.
Como os fornecedores do tecidos são desconhecidos, não foi possível verificar a estrutura da empresa para
conhecer os processos de acabamentos. Entretanto, percebe-se pelas análises que na maioria (quatro das
cinco amostras) apresentam o silicone em sua composição, elemento que é de uso
comum nas indústrias têxteis para conferir um toque macio aos tecidos.
Entre as amostras que foram consideradas como as mais “nobres” (1, 2 e 3),
verificou-se que a diferença técnica entre a Amostra 1 e a Amostra 3 foi muito
pequena, não servindo como justificativa para a enorme diferença de preço,
mesmo que a Amostra 1 apresentasse fio tinto também na trama.
Possivelmente, há uma diferença entre os fabricantes, no que
se refere a marca corporativa, mas essa diferença não é realçada no ponto de
venda.
Esse texto se torna válido no sentido de explicitar questões
técnicas que são desconhecidas do grande público consumidor deste tipo de
tecido. A ideia iniciou em averiguar se o disparate entre preços estava
diretamente relacionado com a qualidade do material e, em termos gerais e qualitativos,
essa hipótese foi confirmada.
Agradecimentos: este estudo foi feito pelas autoras Vera Felippi, Anna Paula Stolf e Christie Meditsch durante o mestrado em Design na UFRGS para a disciplina Seleção de Materais ministrada pelo Prof. Dr. Wilson Kindlein Jr. Contou também com o opoio do
Laboratório de Design e Seleção de Materiais (LdSM), da UFRGS.
REFERÊNCIAS:
BIANCHI, Dante.
Fibras Têxteis: livro técnico. Rio de Janeiro: Ao, 1945.
DICIONÁRIO Cataguases. Disponível em: . Acesso em: 10 nov.
2011.
EMBRAPA. Disponível em: . Acesso em: 5 nov. 2011. [4].
LIMA, Jorge José de. Ensaios físicos em tecidos planos. Rio
de Janeiro: Senai Cetiqt, 2009.
NETO, Pedro Pita Aguiar. Fibras Têxteis. Rio de Janeiro:
Senai-cetiqt, 1996. [6]. SILVEIRA, Silvia. Manual de Matérias Primas.
Disponível em: . Acesso em: 10 nov. 2011.
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