Crochê irlandês
Vou iniciar este artigo alertando, principalmente aos iniciantes no assunto, para que não confundam as técnicas crochê irlandês e renda irlandesa, ambas produzidas no Brasil(*). Outro alerta diz respeito ao termo “Irish lace” (renda irlandesa), encontrado em bibliografias escritas em inglês, pois ele não se refere à técnica produzida aqui no Brasil, mas às diversas técnicas produzidas na Irlanda, tais como: carrickmacross, limerick, youghal e também a Irish crochet.
Algumas fontes internacionais da internet utilizam a expressão em
inglês “Irish lace” para diferenciar os trabalhos feitos em crochê tradicional do crochê irlandês, cuja diferença trataremos mais adiante.
O foco deste artigo é trazer um pouco da história e dos
aspectos técnicos do crochê irlandês.
História
O crochê irlandês surgiu e se difundiu na cidade de
Cork, no sul da Irlanda, por volta de 1840. A autora Bury Palliser (1902)
comenta que os primeiros registros são das irmãs do convento das Ursulinas em
Blackrock, em Cork, quando receberam pagamentos por trabalhos feitos em suas
escolas. A produção da técnica neste convento contribuiu para a inclusão do
ensino do crochê irlandês no sistema educacional de quase todos os conventos do país.
No decorrer dos anos, a cidade de Monaghan, no norte, também teve grande destaque
na produção da técnica.
Iniciativas filantrópicas também contribuíram e incentivaram
a produção do crochê irlandês, isso porque durante os anos de 1845-1849 a
Irlanda passou por um período chamado A Grande Fome. A comercialização das
rendas contribuiu para o sustento de inúmeras famílias. Segundo Palliser (1902)
e Earnshaw (1982), por volta de 1860 haviam em torno de 12.000 mulheres em Cork
ocupadas na produção de rendas. Para que a técnica se espalhasse pelo país,
pessoas treinadas eram enviadas para outras cidades com o intuito de disseminar
o conhecimento.
Mas no decorrer das décadas houve um forte impacto e
concorrência com as rendas produzidas mecanicamente em Nottingham (Inglaterra) e Suíça. Na
Suíça foi inventado o tear Schiffli e a renda manual escolhida para ser imitada
foi o crochê irlandês (Earnshaw, 1982). As rendas mecânicas, apesar de não
imitar perfeitamente as características da técnica manual, eram vendidas por
preços menores e com isso teve uma maior procura. A autora ainda comenta que por
volta de 1930 uma versão inferior do crochê irlandês também passou a ser
produzido na China.
A técnica
O processo de produção do crochê irlandês se difere em
alguns aspectos do crochê tradicional, isso porque na versão tradicional o
processo de tecer consiste na construção de pontos feitos em carreiras e
laçadas. Já no crochê irlandês, a primeira etapa consiste em tecer motivos diversos (com o uso da agulha de crochê). Alguns destes motivos podem ou não
apresentar volumes, tendo esse efeito grande impacto na riqueza visual da peça. Os
volumes a que me refiro predominam no lado direito da peça, enquanto no lado
avesso a superfície geralmente é plana.
Após a confecção dos motivos, eles são fixados com
alfinetes ou alinhavados em uma superfície plana (tecido). Na organização e
distribuição dos motivos sobre a superfície é também onde se define o desenho da peça. Depois de fixados, utiliza-se também uma agulha de crochê (geralmente
muito fina) para confeccionar pontos que tem a função de unir os motivos e, ao
mesmo tempo, cumprir o papel de ser base – ou fundo - da renda. Há diferentes
pontos que podem ser empregados na construção da base.
Ao final, tira-se o alinhavo e o crochê
irlandês está pronto!
No esquema abaixo é possível identificar os motivos e a
base de ligação:
Neste artigo apresentei alguns aspectos históricos e técnicos sobre o crochê
irlandês. Reforço que esta técnica pode estar inserida como uma tipologia de renda devido as
suas características formais e estruturais.
Abraço e até a próxima!
Vera
Agradeço especialmente Ivelise Barssotti pela confecção das
peças em crochê irlandês que ilustram este artigo, as quais estão devidamente referenciados
no texto.
(*)
Sobre a renda irlandesa produzida no Brasil consultar:
FELIPPI, Vera. Decifrando rendas: história, processos e técnicas. Porto Alegre: 2021.
Disponível em: https://issuu.com/verafelippi/docs/decifrando_rendas_ebook-compacto_verafelippi
Referências:
EARNSHAW, Pat. A dictionary of lace. London: Shire Publications, 1988.
PALLISER, Bury. A history of lace. London: William Clowes and Sons, 1902. Disponível em: http://www.gutenberg.org/files/57009/57009-h/57009-h.htm#page26. Acesso em: 26 jan. 2023.
Comentários
Postar um comentário