Galeria African Arte Lisboa e a arte têxtil
Atualmente estou em Portugal pesquisando têxteis africanos. Como mencionei em algumas postagens em redes sociais, estou fazendo um pós-doutorado na Universidade de Lisboa, mais especificamente na linha de investigação em Ciências da Arte e do Patrimônio alojado no Centro de Investigações e de Estudos em Belas-Artes. Esta pesquisa ocorre em parceria com a Associação de Colecções e está focada em uma coleção de têxteis africanos.
O pós-doutorado tem me propiciado experiências inéditas em diversas dimensões da produção têxtil do continente africano.
Uma das experiências relato neste texto que diz respeito à
visita na Galeria African Arte Lisboa*, que fiz no final de agosto de 2023, e foi uma troca de conhecimentos importante para a minha pesquisa.
Na galeria, foi possível estar próximo de alguns exemplares
que arte têxtil produzidas em diferentes países do continente, mais
especificamente em 4: bogolanfini produzido no Mali, kente de Gana, panu di tera
de Cabo Verde e panos produzidos pelo povo Kuba da República Democrática do
Congo.
Segue uma descrição brevíssima sobre cada uma das técnicas,
apenas para contribuir para que aqueles que estão tendo um primeiro contato tenham
uma ideia da riqueza visual dos panos:
Bogolanfini:
Bogo: terra/lama/argila + lan: por meio de/com + fini: tecido.
O Mali é o país onde a técnica se destaca, mas é possível encontrar tecidos decorados com lama também em
outros países como, por exemplo, na Costa do Marfim.
Pano bogolanfini - Coleção Galeria African Arte Lisboa
Kente:
Formado pela costura de tiras estreitas de tecido feito à mão e apresenta padrões coloridos, predominando os geométricos. Esses padrões são resultantes do processo de tecelagem, feitos em teares manuais horizontais, a partir da combinação de fios coloridos no urdume e na trama.
Kente: detalhe - Coleção da Galeria African Arte Lisboa
Importante ressaltar que cada kente tem nome e cada padrão ou motivo tem
nomes e significados próprios. Os nomes e as interpretações desses artefatos
tradicionais emergem de eventos históricos, declarações proverbiais, conquistas
de indivíduos, comportamento de alguns seres vivos, expressões filosóficas,
valores e normas etc. (Ayesu et al, 2021).
Panu di tera:
Produzido em Cabo Verde, em tear manual, com
fios de algodão tingidos. Os fios dispostos no tear, tanto no urdume quanto na
trama, são tramados de forma a resultar em inúmeros padrões onde predominam as
formas geométricas. Cada padrão tem sua simbologia e através deste pano
mensagens, geralmente de proteção, estão presentes.
Conforme consta no site da galeria: "na atualidade, em resultado de conservação das influências africanas e portuguesas, este elemento constitui uma das expressivas manifestações culturais e artísticas do arquipélago Cabo-verdiano."
Pano Kuba:
O reino de Kuba (em algumas
referências também chamado de Bakuba), está localizado na área central da
República Democrática do Congo.
Destaca-se
no povo Kuba os tecidos feitos de ráfia que, de acordo com Glazer (1996), são
utilizados no vestuário pelo povo desde o início do século XVII. Segundo a
autora, mesmo que atualmente outros tecidos estejam em uso, os de ráfia estão
presentes (e são muito importantes) em ocasiões festivas e rituais, envolvendo
ainda questões econômicas, de trabalho e status.
Richard Acquaye (2018) em sua tese intitulada “Exploring
indigenous west African fabric design in the context of contemporary global
commercial production” logo no primeiro capítulo faz menção de que:
“Os têxteis de diferentes partes do mundo evoluíram através de
uma mistura complexa de assimilação cultural, tradução, transformação e
migração das várias diásporas. Isto pode ser parcialmente explicado pelo facto
de os têxteis poderem viajar tão facilmente, absorver uma variedade de
influências culturais e, por sua vez, ter impacto nas mesmas culturas com as
quais entram em contacto; em suma, os têxteis criam e são criados pela
cultura.”
Futuramente, como resultado de minhas investigações, artigos científicos aprofundados serão disponibilizados nos quais pretendo intensificar a divulgação do conhecimento por trás destes panos. Me aguardem...
* LInk para o site da Galeria: https://www.africanartelisboa.com/galeria-african-arte-lisboa
Referências:
Acquaye, Richard. Exploring indigenous west African
fabric design in the context of contemporary global commercial production. University of Southampton, Faculty
of Business, Law and Art. Winchester school of art (thesis).
2018. Disponível
em: https://eprints.soton.ac.uk/429749/
Aherne,
Tavy D. Nakunte Diarra Créatice de Bogolan. In: Au fil de la parole. Paris: Éditions Dapper, 1995. 1.edição
Ayesu, Solomon Marfo; Anokye, David; Fobiri, George Kwame. Aesthetic and Philosophical meanings of Indigenous Asante Kente. Textile & Leather Review. 2021; 4(4):267-281. hps://doi.org/10.31881/TLR.2021.12
Glazer, Joanne. The social and political implications of the Kuba cloths from Zaire. Master of Arts – History of Arts; University of South Africa. November 1996. Disponível em: https://citeseerx.ist.psu.edu/document?repid=rep1&type=pdf&doi=f51f55b8f57616c61d3139f7bcbae602c9d1460e
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