Incrível arte: tapeçaria medieval europeia


Atualmente a palavra tapeçaria pode ser empregada para um grande número de processos e técnicas têxteis, mas aqui, tratarei das tapeçarias que historicamente adornavam castelos medievais da Europa.  
Para escrever esse breve texto, fiz um recorte histórico do  séculos XIV até o século XVIII, pois foi nesse período que ela surge, atinge seu auge e aos poucos perde espaço para outras artes.
No que diz respeito à técnica, tais tapeçarias aqui apresentadas são construídas em teares de urdume e trama (ao final do texto menciono um vídeo que ajuda a ilustrar tal processo).


Registro feito pela autora no Castelo dos Duques de Guimarães - Portugal
A obra é uma reprodução feita em 1936 (em Madri) de uma tapeçaria do século XV que narra a entrada de D. João de Bragança no Tanger. 

As considerações aqui apresentadas são  apoiadas em referências que estão listadas no final do texto. Então, me acompanhem nessa história!
A expansão das tapeçarias ocorreu depois de 1350 e, deste período, restam poucos exemplares. Isto porque os materiais utilizados se desgastavam com o tempo ou, como no caso do uso de fios de ouro, muitas vezes tais peças eram roubadas. Um dos principais locais de produção foi a França e ali se instalaram manufaturas que existem até os dias de hoje, como é o caso da Manufatura de Gobelins.
Uma das poucas (e mais antigas) peças que restam que ilustra o período de sua expansão é a tapeçaria “St Michel fighting the Dragon” tecida por volta de 1375-1380 e atualmente está no Chateau d”Angers, na França (altura 250cm x largura 325cm). 



Imagem do interior do Chateau d´Angers com a coleção de tapeçaria:


As tapeçarias consistiam em um tecido com urdume e trama e, para criar as cenas, a trama predominava. Nas tapeçarias eram utilizadas principalmente a lã e seda, mas dependendo do país em que era produzida, usava-se também o linho. A lã, constantemente aparecia como urdume e também como trama.
De acordo com Thomas Campbell do MET, “a qualidade de uma tapeçaria depende principalmente de quatro fatores variáveis: a qualidade do desenho a partir do cartão do qual é copiada: a habilidade dos tecelões em traduzir o desenho em forma de tecido; a finura do tecido (o número de fios por centímetro e o grau da trama, que afetam diretamente a precisão dos detalhes e a qualidade pictórica da tapeçaria); e a qualidade dos materiais a partir dos quais é feita”.
Os tecelões tinham autonomia para interferir  nos desenhos e cores, porém a partir do renascimento o tecelão deixa de ser um colaborador na produção da tapeçaria e passa a ser “apenas” o executor dos desenhos feitos nos cartões. Isto porque entram em cena os cartões feitos por grandes pintores, como ocorreu na Itália. A Itália se destaca não pela produção da tapeçaria, mas porque em 1516 o grade artista Rafael Sanzio criou alguns cartões  a pedido do Papa Leão X (1474-1521) e pelo seu sucessor Clemente VII (1523-34)*. A produção da tapeçaria foi feita em Bruxelas.
Os mais famosos cartões feitos por Rafael conta a história de Atos dos Apóstolos, criados entre 1515-17 e tecidos entre 1516-21. Uma das obras intitula-se “The Miraculous Draught of Fishes”, feito em lã e seda,  medindo 4,92m x 5,12m.


A tapeçaria, inicialmente destacou-se na França graças ao patronato dos nobres franceses e eram usadas para aquecer os frios castelos. Além disso, como eram muito caras, era uma forma de impressionar os visitantes. Mas esse interesse se espalhou por outros reinos...
Nos séculos XV e XVI a tapeçaria atingiu seu auge. Carlos V (1500-58) da Espanha e Imperador do Sacro Império Romano, Francisco I (1494-1547) da França e Henrique VIII (1491-1547) da Inglaterra eram entusiastas desta arte! Para se ter uma ideia, quando Henrique VIII morreu, a coleção de tapeçarias alcançava o impressionante número de 2.000 itens (Campbel, Thomas).
Já Luis XIV (1638-1715) não só apreciava como também tinha exclusividade na produção das tapeçarias provenientes da Manufatura de Gobelins. Há uma série de 14 obras  intitulada “The History of Louis XIV” que foi produzida em sua homenagem. Abaixo ilustro o conjunto com a tapeçaria chamada “King Louis XIV visiting the Gobelins Manufactories” (1673-9) feita em lã, seda e fio de ouro, medindo 4.9 x 6.88m.


Mas, esta arte tão apreciada, cara e bela também teve seu declínio. De acordo com Jennifer Harris, a demanda por tapeçarias começou a declinar na segunda metade do século XVIII, pois começou a disputar espaço nas paredes com as coleções de pinturas e papeis de parede chineses. Ao final do século XVIII muitos ateliês na Inglaterra e Bruxelas fecharam suas portas. Na França, foi a Revolução Francesa que apagou o brilho dos ateliês e os que sobreviveram remodelaram sua produção para peças menores e diversificação de produto (Manufatura de Gobelins e Beauvais Manufatura)
A propósito, encontrei  um vídeo que explica a tecelagem da Manufatura de Gobelin, acesse para conhecer mais: The art of making a tapestry
Esse vídeo não só ilustra o processo de tecelagem, mas também mostra como é a produção atual das tapeçarias.
Ao ler este texto talvez algumas pessoas se perguntem sobre uma das mais famosas e mencionadas tapeçaria, a de Bayeux. Essa tapeçaria, não é feita de urdume e trama, mas trata-se de um bordado. Ela é composta por 9 painés de linho,  bordada em e lã, totalizando  70metros de comprimento x 0,50m de altura (sim, 70 metros!) e foi tecida entre 1070 e 1080. Essa obra retrata a conquista da Inglaterra por Guilherme, “O Conquistador”, duque da Normandia. Em 1804, Napoleão a exibiu em Paris, enquanto planejava uma invasão da Inglaterra.
Tapeçaria de Bayeux

Detalhe da tapeçaria de Bayeux


Bom, vou encerrar por aqui...mas em breve escreverei mais sobre este e outros assuntos do mundo têxtil.

Referencias:
Metropolitan Museum, Thomas P. Campbell  : https://www.metmuseum.org/toah/hd/tapm/hd_tapm.htm

Enciclopédia Britannica

Harris, Jennifer: 5000 years of textiles. Washington DC: Smithsonian Books, 2010. 


Comentários

  1. Por favor, rectificar: "Registro feito pela autora no Castelo dos Duques de Bragança Portugal", na reprodução feita em 1936 (em Madri) da tapeçaria do século XV que narra a entrada de D. João de Bragança no Tanger.
    Explicação: o Palácio situa-se na cidade de Guimarães, mas o Palácio é dos Duques de Bragança (pretendentes e descendentescda Casa Real de Portugal).
    Duques de Guimarães não existem.

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